O mês de julho carrega um significado especial para as mulheres negras da América Latina e do Caribe. No Brasil, esse período é conhecido como Julho das Pretas, em alusão ao Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, celebrado em 25 de julho. Mais do que uma data, é um movimento que reúne manifestações culturais, rodas de diálogo e ações afirmativas que celebram a resistência e visibilizam a luta contra o racismo, o sexismo e as desigualdades estruturais.
Em Palmas (TO), essa força tem nome e voz: o Grupo Vozes de Ébano. Criado em agosto de 2024, o grupo nasceu com o propósito de ecoar, através da arte e da cultura, o protagonismo de mulheres negras. Formado pelas artistas Cinthia Abreu, Fran Santos e Malusa, o Vozes de Ébano rapidamente ganhou repercussão e hoje é considerado uma referência no cenário artístico e social do Tocantins.
Com menos de um ano de existência, o grupo já impactou mais de 10 mil pessoas em apresentações ao vivo, contabiliza vídeos com cerca de 30 mil visualizações nas redes sociais e mobiliza uma equipe com cerca de 50 pessoas — mais de 90% negras e 80% mulheres. Seus shows têm lotado plateias e todos os ingressos se esgotaram nas temporadas já realizadas.
Música como ferramenta de resistência
Uma das obras de destaque do grupo é a canção “Senzala”, lançada em novembro de 2024 e disponível nas plataformas digitais. Com autoria do músico Lucimar, a música já soma cerca de 10 mil visualizações e se tornou um hino de afirmação da ancestralidade, empoderamento negro e combate ao racismo.
Com letra poética e uma sonoridade envolvente, “Senzala” convida o ouvinte à reflexão sobre a herança histórica do povo negro, exaltando a força de quem transformou dor em luta e luta em liberdade.
“Ver a dimensão que o Vozes de Ébano tomou em tão pouco tempo é emocionante. Mostra que a sociedade tem sede de representatividade e de histórias reais contadas por nós mesmas”, afirma Cinthia Abreu.
“É muito forte olhar para o público e ver mulheres se emocionando, se vendo na gente, nos nossos cantos, nas nossas dores e alegrias. Essa conexão é transformadora”, complementa Fran Santos.
Já Malusa resume: “A arte tem sido nossa forma de dialogar com o mundo. Cada palco que subimos é um espaço conquistado por todas as mulheres negras que vieram antes de nós.”
Arte, ativismo e ancestralidade
Unindo música, poesia e teatro, o Vozes de Ébano utiliza suas apresentações como instrumento de ativismo social e afirmação identitária. Seus espetáculos abordam desde as dores causadas pelo racismo até o orgulho de ser negra, transformando o palco em território de cura, denúncia e memória.
“Nossa arte é denúncia, é cura e é memória. Recontamos nossas histórias de forma digna, potente e afetiva”, destaca Cinthia.
“O palco é o nosso quilombo. É onde a gente se fortalece, se reconhece e resiste com beleza e consciência”, afirma Fran.
“Falar das nossas vivências por meio da música e da poesia é uma forma de nos libertarmos das amarras impostas e abrir caminhos para outras mulheres negras”, finaliza Malusa.
No repertório do grupo, estão nomes consagrados como Elza Soares, Alcione, Leci Brandão, Iza, além de composições autorais e textos de Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus, Elisa Lucinda, Victoria Santa Cruz, entre outras vozes negras fundamentais.
As apresentações contam com banda ao vivo, iluminação cênica e forte apelo visual e sonoro. A última temporada passou por Porto Nacional (19/06), Palmas (05 e 06/07) e Paraíso do Tocantins (10/07). Novas apresentações estão previstas para agosto — a programação completa está disponível no perfil oficial do grupo no Instagram: @vozesdebano.
Por que empoderar é urgente?
Embora 75% da população do Tocantins se declare negra (pretos e pardos), a representatividade ainda é limitada. Apenas 7,3% dos prefeitos eleitos no último pleito se autodeclararam pretos. Por outro lado, os índices de violência escancaram a desigualdade: segundo o Disque 180, 71% das vítimas de violência no estado são mulheres negras. Já os dados sobre mortes violentas revelam que 80% das vítimas do gênero feminino são negras.
“Esses números mostram por que é essencial falar sobre racismo, sexismo e representatividade. A nossa arte é também um ato político”, afirma Cinthia Abreu.
Para Malusa, o Julho das Pretas é mais do que uma homenagem: “É um lembrete de que a equidade racial e de gênero precisa ser pauta todos os dias. É um chamado à ação e à responsabilidade coletiva.”
“Quando uma mulher negra avança, toda a sociedade avança. Nosso grupo continua uma trajetória de ativismo histórico e ancestral”, pontua Fran Santos.
Cinthia finaliza destacando o exemplo de Tereza de Benguela, homenageada no dia 25 de julho, como um dos símbolos dessa luta:
“Os desafios ainda são muitos, mas nossa história é feita de resistência, desde os tempos da escravidão até hoje. E seguimos transformando dor em força, com arte, coragem e consciência.”
Você sabia?
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A data de 25 de julho foi criada em 1992, no 1º Encontro de Mulheres Negras Latinas e Caribenhas, na República Dominicana.
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No Brasil, foi oficializada em 2014 como Dia Nacional de Tereza de Benguela, líder quilombola e símbolo de resistência feminina negra.
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Segundo o Atlas da Violência (2023), 66% das vítimas de feminicídio no Brasil são negras.
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Mulheres negras também são as mais impactadas pela desigualdade tributária no país, pagando proporcionalmente mais impostos em razão do sistema regressivo de tributação.
Sobre o Grupo Vozes de Ébano
Lançado em agosto de 2024, o Vozes de Ébano é um grupo artístico-cultural formado por mulheres negras do Tocantins. Através da música, poesia e teatro, o grupo promove a valorização das ancestralidades negras, o combate ao racismo e a afirmação de identidades.
Com uma linguagem sensível, potente e envolvente, o grupo já alcançou milhares de pessoas em apresentações presenciais e online, consolidando-se como uma das principais vozes culturais do estado.
📲 Acompanhe o grupo no Instagram: @vozesdebano
📧 Contato para convites, parcerias e entrevistas: [email protected]


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