Unindo forças e recursos para impulsionar o desenvolvimento de uma economia mais justa e equilibrada e para fortalecer o ecossistema dos negócios de impacto no Brasil, três organizações, a Yunus Negócios Sociais Brasil, a Trê Investindo com Causa e a Somos Um – esta com base no Ceará – criaram um programa de investimentos de impacto social que pretende aportar até R$ 6,5 milhões iniciais em negócios localizados nas regiões Norte e Nordeste que visem desenvolver soluções para problemas socioambientais. No último dia 10 de maio, foi iniciada a chamada para a seleção dos negócios que desejam investimento. As inscrições seguem até 5 de junho.
O objetivo do Programa Zunne é fomentar uma nova rota de investimentos que não gire apenas em torno do Sudeste e democratize não só o acesso aos recursos – no caso dos negócios investidos -, mas proporcione a oportunidade de mais pessoas tornarem-se investidoras, considerando valores acessíveis para iniciar o investimento.
Norte e Nordeste no foco dos investimentos
De acordo com o Censo Gife 2020, a atuação do investimento social privado está concentrada na região Sudeste, uma vez que grande parte das operações também fica na região. O Censo Gife é a principal pesquisa sobre investimento social privado no Brasil. A última edição do levantamento aponta que 77% das iniciativas são desenvolvidas no Sudeste e 29% em todas as demais unidades da Federação. Para os criadores do programa Zunne, pelo tamanho das regiões Norte e Nordeste e pela proporção dos desafios enfrentados por elas, o número de recursos sociais investidos nelas ainda é pequeno. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) da ONU, as regiões Norte e Nordeste têm os menores Índices de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM).
Para Ticiana Rolim, presidente da Somos Um e uma das idealizadoras do Programa Zunne, apesar de serem as regiões mais pobres do País, o Norte e o Nordeste possuem grande potencial empreendedor. “Essas regiões são repletas de pessoas de muita criatividade, resiliência e garra para lidar com todos os desafios impostos pela pobreza. Por isso, acreditamos que trazer esse instrumento para dar oportunidades para empreendedoras sociais, para que elas empreendam e prosperem, ao mesmo tempo em que ajudam a resolver problemas sociais das regiões, é uma grande chave para que a gente possa reduzir desigualdades e acabar com a pobreza. Esse número pequeno de investimentos sociais nas duas regiões precisa mudar”, afirmou a investidora.
Outro desafio, de acordo com o 3º Mapa de Negócios de Impacto Socioambiental, estudo realizado pela Pipe.Social, apesar de haver uma equidade de gênero (mulheres estão presentes em 67% dos negócios mapeados e os homens, em 71%), negócios administrados apenas por um time feminino tendem a receber menos recursos financeiros e outros apoios para evoluir na jornada, quando comparados a negócios liderados apenas por um time masculino. Com isso, elas estão menos presentes entre os negócios em fase de escala (25% contra 35%) e são menos aceleradas (20% conseguiram esse apoio contra 32% dos negócios liderados apenas por homens). Quando as empreendedoras são mulheres negras e indígenas esse desafio se torna ainda pior.
Foi a partir dessa percepção que a Somos Um, a Yunus Negócios Sociais e a TRÊ Investindo com Causa se uniram para criar o programa Zunne. “Não adianta só reclamar que não vem dinheiro. Precisamos ter instrumentos para viabilizar que o dinheiro chegue até as regiões. O Zunne foi esse instrumento criado pelas nossas três organizações para viabilizar que o dinheiro chegue no Norte e Nordeste. Justamente para democratizar o acesso aos recursos de investimento, trazer oportunidades para as empreendedoras nortistas e nordestinas. Vamos apoiá-las com mentorias e investimento para que possam prosperar tanto quanto outras regiões e para aquelas que historicamente têm mais dificuldades, possam garantir acesso aos recursos”, destacou Ticiana.
Segundo a executiva, é necessária a conscientização dos investidores, dos empresários, dos grandes empreendedores dos próprios Norte e Nordeste para que eles invistam dentro dos territórios e para que o dinheiro circule nas regiões. “Por outro lado, a gente precisa também trazer recursos do centro financeiro do Brasil para cá. E, dessa forma, não ganhará apenas o Nordeste, mas o Brasil inteiro. É um benefício para o País como um todo”, concluiu Ticiana.
“O Ceará, assim como outros estados do Nordeste, tem sido um exemplo muito positivo quando se fala em um ecossistema conectado com o desenvolvimento dos negócios de impacto social. Além de iniciativas como a da Somos Um, outras iniciativas têm aberto espaço para a discussão e fomentado o debate tão relevante sobre como as pessoas têm investido seu dinheiro e como isso pode ser feito de maneiras diferentes. Vamos fazer nossa parte permitindo o dinheiro fluir para onde é necessário e construindo juntos uma nova economia”, acrescentou Marcos Pedote, cofundador e diretor da TRÊ Investindo com Causa.
Captação de recursos
O Programa Zunne tem estrutura Blended Finance (quando une-se capital filantrópico com investimento). Ou seja, o montante aportado será advindo em parte de doações de filantropos e o restante de recursos de grandes e pequenos investidores (pessoas físicas ou jurídicas). Será possível fazer investimentos a partir de R$ 1 mil.
Na prática, dos R$ 6,5 milhões iniciais, R$ 1,5 milhão são fruto de doações. Deste R$ 1,5 milhão, foram direcionados R$ 500 mil para apoio técnico e R$ 1 milhão para o fundo garantidor de inadimplência. Os outros R$ 5 milhões que compõem o programa deverão ser aplicados pelos investidores, sendo R$ 3 milhões distribuídos em 3 cotas de R$ 500 mil e o restante em cotas acima de R$ 100 mil. Já os pequenos investidores formarão a última fatia de R$ 2 milhões que formam o programa, podendo participar com cotas a partir de R$ 1 mil.
O Zunne oferecerá ao investidor retorno de 10% ao ano sobre os aportes (equivalente ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) + premiação), além de fundo garantidor de inadimplência em até 20%. O prazo de carência será de seis meses e o retorno do investimento será em até quatro anos.
“Não é um programa de investimentos como os convencionais, que buscam a lucratividade, é uma ação que visa prioritariamente o impacto social”, concluiu Ticiana.
O que o programa oferece aos negócios investidos?
Além do apoio financeiro, o Zunne oferecerá capacitação com especialistas nas áreas jurídica, financeira, de marketing digital e vendas, gestão de negócios e outras; auxílio e orientação na obtenção de acesso a capital em diferentes formatos, conexões com redes de potenciais clientes e parceiros e coleta de dados financeiros e de impacto para mensuração do impacto alcançado.
“Entendemos que, além de dinheiro, as empresas precisam também de acesso a capacitação, redes, conexões e novos mercados. Por isso, vamos oferecer também apoio não-financeiro aos negócios selecionados. Essa é a maneira que a Yunus atua na concessão de empréstimos há mais de 7 anos no Brasil e queremos replicar essa prática no Zunne”, explicou Francisco Vicente, diretor de investimentos da Yunus Negócios Sociais.
Os empréstimos deverão variar entre R$ 100 mil a R$ 500 mil e as taxas de juros sociais girarão em 17,8% ao ano, ou seja, 1,4% ao mês. Os pagamentos poderão ser realizados em até quatro anos, com seis meses de carência.
Para estar elegível ao programa, os negócios deverão atender aos seguintes critérios: ser negócio de impacto socioambiental positivo; reportar impacto; ter atuação nas regiões Norte ou Nordeste; ter faturamento mínimo anual de R$ 400 mil; prioridade para: negócios com liderança feminina e/ou pessoas pretas e indígenas; CNPJ no Norte e Nordeste, oferecer soluções envolvendo os biomas Amazônia ou Caatinga.
As etapas da jornada do Zunne já começaram. O valor de doação já foi captado, e as cotas de investidores âncoras já ultrapassam os R$ 3,7 milhões. No último dia 10 de maio, foi iniciada a chamada para a seleção dos negócios que desejam investimento no Norte e Nordeste. As inscrições seguem até 5 de junho. Após a seleção, será realizada uma chamada para que os investidores que se comprometeram possam escolher os negócios que querem investir e façam o aporte do recurso. Esta fase deve ocorrer entre os meses de agosto e setembro. Com os negócios escolhidos e com recurso investido, serão iniciadas as mentorias para os negócios investidos e o repagamento dos empréstimos com parcelas mensais.
*Com informações do site GCMais
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